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I Wanna be the Guy

Como algo supostamente ruim, pode ser incrível?

21 de outubro de 2019

I Wanna be The Guy é um sucesso improvável que reflete muito sobre como o consumo de games nos dias de hoje funciona. É um game com uma jogabilidade propositalmente zoada, injusta e punitiva de forma desproporcional.

A primeira versão foi feita em 2007 por um único desenvolvedor, Michael O’Reilly. Atualmente ele anda trabalhando no seu projeto Brave Earth, um jogo de plataforma com visual retrô, mas dessa vez com um level design justo. Esse jogo ainda está sem previsão de lançamento.

Bem, a grande questão aqui é que provavelmente você já conhece I Wanna be The Guy. Talvez você nunca tenha jogado, mas certamente já viu esse jogo cretino em algum canal maior, com um youtuber se descabelando de raiva. É particularmente curioso analisar um fenômeno como esse, porque esse é em teoria um jogo ruim. Seu level design é irritante.
O que parece ser uma plataforma comum, na verdade é um inimigo. O que parece ser só mais um detalhe de cenário, com certeza vai te matar. Checkpoints são escassos e com muito espaçamento entre eles, só pra te dar aquele back tracking irritante e fazer você morrer de novo, de novo e de novo.

Certo. Mas porque isso é bom?
Pra entender isso melhor, vamos dar uma olhada breve no cinema.

Vou usar o cinema como base só pra dar um exemplo. Está vendo esse pneu tranquilamente girando sozinho, fazendo suas vítimas no deserto americano? Esse é Rubber, o pneu assassino. É um filme gore contando a história de pneu, assassino. Sim, ridículo assim. É filme é bem ruim e foi feito pra ser dessa forma. Dá pra colocarmos um monte de filmes aí, tipo… Sharknado ou outros filmes feitos para serem exclusivamente ruins.

O cinema existe há mais de 100 anos, então é mais fácil conseguirmos reconhecer seus padrões. E se conhecemos um padrão, nós conseguimos subverter-los. Rubber é um filme que usa vários signos que já conhecemos do cinema de terror trash, pra poder criar uma expectativa no espectador, para então parodiar um gênero. Muitas vezes essas piadas são críticas à problemas de filmes sérios ou recursos narrativos que são usados à exaustão.

Por exemplo, vamos imaginar um filme de terror. A protagonista está sozinha em casa e escuta um barulho estranho no porão. Está tudo escuro, silêncio absoluto. Você, espectador, sabe que tem algo de muito suspeito nessa cena, e acompanha a protagonista lentamente descer as escadas até o porão. A câmera acompanha a personagem bem de perto, que tateia as paredes pra achar um interruptor. Uma sombra passa por de trás dela. Ela se assusta, leva a mão rapidamente pro interruptor, a trilha sonora aumenta, a personagem grita e…. era só um rato passando perto do pé dela. O filme usou vários sinais que nós já conhecemos de vários outros filmes de terror. A escuridão, câmera próxima do personagem, trilha sonora crescente, tudo isso pra te dar um falso susto. O filme usou um recurso narrativo que já existe em vários outros filmes, pra quebrar uma expectativa. Esse momento de quebra é muito importante pra deixar o espectador sempre em alerta, porque se ele te preparou pra algo que você já conhece e mostrou que aquelas regras não funcionam naquele contexto, o caminho é desconhecido. Isso torna tudo mais interessante.

I wanna be the guy usa recursos parecidos com esses que citei, para pegar as suas expectativas de level design e subverter-las. No primeiro momento o jogo te passa uma série de sinais familiares ou até mesmo idênticos à outros jogos. E logo no primeiro momento, ele quebra esse conceito, ensinando que você nunca deve confiar no que você já conhece nos jogos. Mostrando um caminho completamente desconhecido sobre o que vem a seguir. Isso te deixa em alerta constante, lidando sempre com incertezas. Como por exemplo o jogo de matar na tela de seleção de fases, que supostamente era pra ser um lugar seguro.

É divertido lidar com quebras de expectativas, mesmo que essas tenham um certo grau de frustração. Acompanhar isso de forma social melhora muito essa experiência e testemunhar alguém passando raiva, é sem dúvida muito mais divertido do que passar essa raiva em si. Assistir alguém lidando com jogos como Cat Mario ou Getting Over It, são deleites, porque também nos surpreendemos com essa subversão. O youtube tem um impacto devastador sobre o consumo de jogos nos dias de hoje e sem dúvida esse foi um dos principais fatores do sucesso desse jogo.

I wanna be the guy tem uma sequência, I wanna be the guy gaiden, que assim como o jogo original, é completamente gratuito. Só baixar no link da descrição.
Então eu te convido a revisitar esse jogo tão importante por popularizar esse gênero tão específico de jogos.

Você tem que jogar I wanna be the guy!

http://kayin.moe/iwbtg/downloads.php

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